segunda-feira, janeiro 07, 2013

Holy Motors


Afasto-me do Cinema com um misto de entusiasmo e amargura. Amargura porque não tenho uma bagagem cinematográfica tão ampla que me tenha feito reconhecer as obras visitadas por Leos Carax, aliás, este é o meu primeiro filme do realizador. Não é algo que deve ser encarado como um obstáculo para o ver, apenas me pareceu que perdi qualquer coisa ao não ter reconhecido o M. Merde ou ao não saber que o casal que surge perto do final é o mesmo de "Les amants du Pont-Neuf", bem como a máscara usada por Edith Scob no final, entre outros pormenores. Essa amargura rapidamente vai desaparecendo à medida que me afasto do Cinema, mas com o filme ainda bem presente na mente. Se uns vão revisitar a obra do cineasta ao ver este filme, eu vou descobri-la, e posteriormente rever novamente "Holy Motors", em busca dessa sensação de saudosismo à qual não tive direito.

Como disse "Holy Motors" é uma viagem pelo Cinema, onde este se mistura com a própria vida, a ponto de não sabermos onde termina um e começa o outro. É o próprio realizador a interpretar "Le dormeur" (nome por qual é apelidada a personagem) e a descobrir um portal em sua casa, portal esse que nos transportará a todos para o Cinema e para experienciar algo singular.

A imagem segue para Oscar (Denis Lavant), o protagonista, que utiliza uma limusina não só como transporte, mas como camarim também - Juntemos o filme ao último de Cronemberg e temos aqui o carro do ano. Oscar trata-se de um actor, um actor em tempos modernos onde as câmaras quase invisíveis substituíram as gigantes clássicas. Algo amargurado com a situação actual dos tempos, Oscar continua na mesma o seu trabalho, acreditando que ainda tem público, que ainda é observado, mesmo que tal nunca seja comprovado.

É um filme fora do vulgar, tanto experimentalista como surreal. Não tem uma estrutura narrativa linear e não está minimamente preocupado com isso. "Holy Motors" abre-nos a porta da sua limusina convidando-nos para um passeio e a abertura que temos para o mesmo cabe-nos a nós exclusivamente. Se aceitarmos o convite, livre de tabus e preconceitos, podemos apreciar uma viagem com alguns momentos de verdadeiro esplendor. Dei por mim a ansiar pelos próximos trabalhos de Oscar sempre na expectativa do que se seguiria e para que novo mundo nos transportariam agora, pois o leque de papéis e sequências é tão diverso como distinto. Quem se esquecerá do segmento grotesco do já mencionado M. Merde, ou da expressão corporal em motion capture? Dois exemplos do que do melhor se pode encontrar nesta peça.
De salientar Denis Lavant que volta a trabalhar com o realizador para nos brindar com uma das representações do ano.

Havia qualquer coisa de "Divine Comedy" na canção protagonizada pela personagem de Kyle Minogue - numa bela cena. Daí que quando vi o nome de Neil Hannon como um dos responsáveis pela sua composição (a par do realizador) tudo fez sentido.

2 comentários:

André Azevedo disse...

Gabriel,

Se vais revisitar a obra do Leo Carax então deixo-te aqui uma sugestão:

Se ainda não conheces ouve antes a música do Scott Walker dos anos 60 e 70. Vais encontrar coisas surpreendentes.

Se depois vires o filme Pola X de 1999 então vais-te surpreender ainda mais. A banda sonora foi produzida pelo Scott, com algumas músicas dele e outras dos Sonic Youth (entre outros).

Já não sei onde, com que palavras e quem disse isto a propósito da obra recente do Scott Walker mas tem toda a razão:
Quando se cai e a escuridão é plena qualquer raio de luz é de uma beleza insuportável.

Loot disse...

Estava a guardar o Pola X para o final. Após esse filme o Carax afastou-se, pelo menos, uma década das longas metragens. Parece que aquilo foi mto mal recebido.

Obrigado pela dica, vou ter isso em conta.